domingo, 6 de fevereiro de 2011

A SEIS DE JANEIRO DE 1852, EM PARIS, FALECIA LOUIS BRAILLE



Louis Braille nasceu em 4 de janeiro de 1809 no povoado de Coupvray, cerca de 40 quilómetros a leste de Paris e perto da magnífica e extensa faixa de terras de cultura de trigo de La Brie. Alojado no declive dos suaves vales cobertos de árvores do rio Marne, Coupvray era um animado povoado rural.

O pai de Louis, Simon-René, era seleiro e fabricante de arreios do povoado.
Não existe registo exacto sobre o momento em que Louis Braille ficou cego no ano de 1812.A história foi sendo montada a partir de lembranças de diferentes pessoas; o resto temos que supor, deduzir por nós mesmos. Mas não é difícil imaginar o curioso garoto de 3 anos querendo copiar o trabalho que via seu pai fazer diariamente; subindo na alta mesa de madeira, talvez quando Simon-René estivesse fora por um momento, no quintal, conversando com um fazendeiro sobre os reparos necessários para algum arreio.

Pode-se imaginar Louis medindo um pedaço de couro, tentando alcançar uma faca, imitando ansiosamente aqueles movimentos precisos e difíceis das habilidosas mãos de seu pai.

Mas, nas mãos gorduchas do menino, o instrumento de trabalho cortante e afiado era simplesmente um rude e muito eficiente objecto de destruição. Imaginemos um grito vindo da oficina, o menino encontrado soluçando, com o sangue cobrindo seu rosto.]

A ferramenta manejada desajeitadamente, segundo parece, havia cortado seu olho.

Em pânico, seus pais fizeram tudo o que puderam: água fresca e linho branco para cobrir o olho que sangrava; uma velha mulher do povoado, que conhecia as propriedades de cura das ervas, levou água de lírio e eles puseram uma compressa sobre o olho ferido.

Mas naquela época os médicos não conheciam as causas nem o controle das infecções. Foi muito antes de o trabalho do cientista Louis Pasteur ensina-los sobre germes e como a infecção se desenvolve e é transportada pelas mãos, pelas compressas e pelo ar. Foi mais de cem anos antes de Alexander Fleming descobrir a penicilina, o primeiro antibiótico a curar infecções, matando germes perigosos sem causar danos ao paciente. O outro olho foi contaminado e ele perdeu aos poucos completamente, a visão com apenas 5 anos de idade.

Aos 6 anos, três deles em completa cegueira, começou uma nova era para ele. Chegou à cidade um novo pároco que assim que conheceu Louis, se afeiçoou a ele e iniciou uma série de lições a Louis. Contou histórias bíblicas, ensinou a reconhecer os perfumes, o toque das flores e a identificar os sons de diferentes pássaros e animais. Falava sobre as estações do ano e as mudanças que ocorriam durante o dia. Despertou nele uma profunda fé religiosa que o acompanharia pelo resto de sua vida.

Finalmente, chegou à idade escolar. Na escola do povoado havia um jovem professor : Antoine Bécheret.

O abade foi logo procurar o professor para falar sobre Louis.

A maioria das pessoas não viam sentido em dar a um menino cego as mesmas aulas dadas a outras crianças, mas Louis, esperto, inteligente, interessado em tudo que o cercava, certamente se beneficiaria ao ouvir as aulas, ao compartilhar a vida escolar com os outros meninos do local!

E foi assim que Louis Braille passou a ir à escola, todos os dias. Desde o começo só de ouvir, ele foi um dos primeiros da classe; ele havia decidido não aceitar que a sua cegueira pudesse ser uma prisão sem livros, um mundo sem a chance de se comunicar com seus amigos, registar suas ideias ou fazer anotações.

O pai de Louis martelava pregos na madeira formando as letras do alfabeto e Louis aprendia sozinho a reconhece-las pelo tacto. Outros relatos dizem que seu pai cortava o couro em formato de letras.

Existem diversas versões sobre como a família de Louis foi informada sobre a escola especial para cegos em Paris, mas a mais provável é a de que o jovem professor Bécheret se recordava de ter ouvido sobre a escola e que o abade Palluy, estimulado por essa descoberta, planejava descobrir mais ainda.

Ajudas importantes como do marquês de Orvilliers, do Abade os aproximou do fundador dessa escola, chamado Valentin Haüy.

Fora na corte real de Versalhes, durante as comemorações do Natal de 1786. Valentin Haüy surpreendera o rei, a rainha e a grande audiência da nobreza da França com uma única demonstração de aritmética e leitura por crianças cegas. Na verdade, o marquês, muito impressionado, unira-se ao casal real e vários outros ali presentes na doação de dinheiro para a nova escola para crianças cegas de Valentin Haüy.

A pedido do abade Palluy, o marquês de Orvillliers escreveu imediatamente ao Director da escola em Paris e pediu permissão para Louis se tornar seu aluno.

A resposta não demorou a chegar. O Dr. Guillié, diretor da Instituição Real para crianças cegas em Paris, informou-o de que os membros do Conselho da Instituição havia concordado em oferecer um lugar para Louis e estavam dispostos, ainda, a fornecer uma pequena bolsa de estudos para ajudar a pagar as mensalidades.

Louis era aguardado na instituição, localizada na rua Saint-Victor, no dia 15 de Fevereiro de 1819, logo depois de seu décimo aniversário.

A VIAGEM A PARIS

Louis havia esperado com emoção por aquele dia. Seu pai estava também ansioso e profundamente preocupado com a distância que o separaria da família, mas, desejava também que o filho tivesse oportunidade de aprender novas coisas e quem sabe uma profissão?! A escola ensinava várias: fabricar sapatos, trançar cestas, confeccionar cordas, fiar e tecer, fazer chinelos, consertar cadeiras...

Rua Saint-Victor, 68


Relatos oficiais da época descrevem que a casa situava-se " em uma região humilde, abafada, malcheirosa e propensa a disseminação de doenças". Era escura e húmida, uma "ratoeira" de escadas gastas e corredores apertados que encheu Simon-René de apreensão. Onde estava a alegre luminosidade de Coupvray, o ar puro e a vida saudável ao ar livre que seu pequeno Louis estava acostumado a livar?

Foi levado directamente para uma sala de aula. O director apresentou o professor: era o Sr. Dufau que o conduziu a um assento e sem mais barulho, a lição foi retomada. Em minutos, nervosismo, preocupação e timidez haviam desaparecido. Louis absorvia cada sílaba com fascinada atenção e, no final, para grande surpresa do professor, pôde responder a todas as perguntas sem a menor hesitação.

Um capitão da artilharia do exército do rei Luís XVIII, Charles Barbier, procurou o Dr. Pignier com uma interessante proposta. Ele inventara uma forma escrita usando somente pontos e traços em relevo. Desenvolvera o método de modo que as ordens militares pudessem ser passadas secretamente entre os soldados, não importando o quão escuro estivesse, e baptizara o sistema de " escrita nocturno".

Ao mesmo tempo, ele assistira a uma demonstração no Museu da Indústria: alunos cegos leram livros de Valentin Haüy, aquelas páginas grandes preenchidas com enormes letras em relevo. O capitão Barbier ficara pasmado com a lentidão do processo de traçar cada contorno da letra.

Isso o motivou a incrementar o trabalho, modificando sua " escrita nocturna" (night-writing) para que pudesse ser usada pelos cegos. Barbier expôs o sistema – que havia rebaptizado como sonografia – para o Dr. Pignier. Não usara letras individuais para soletrar as palavras, mas transformou sons inteiros em grupos de pontos e traços.

Inventores inspirados bateram às portas da instituição, mas, uma vez experimentadas pelas crianças, suas ideias se mostraram inúteis.

No entanto, o uso de pontos era algo novo. Todos os outros sistemas haviam sido baseados no alfabeto usado por pessoas de visão normal. Modificados, eles então podiam ser sentidos em vez de vistos. Aquela sugestão sobre pontos e traços foi suficientemente diferente para o Dr. Pignier ouvir com atenção e discutir a invenção com certa minúcia, até declarar que poderia ser testada com os alunos.

Louis e seus amigos ouviram falar do invento do capitão, pela primeira vez, quando o Dr. Pignier reuniu todos os alunos, alguns dias depois. Houve então uma lenta e minuciosa descrição da invenção do capitão e para as poucas páginas em relevo que o Dr. Pignier distribuía entre os meninos para serem examinadas com os dedos.









Louis domina o sistema

Pontos! Louis estava petrificado. Imagine-se a primeira tentativa, o toque, murmúrios de interesse sussurrados entre os alunos, o traçado lento dos pontos, a exploração dos diferentes formatos, e então, lentamente, a agitação aumentando, como se todos eles fossem percebendo quanto aquelas formas eram mais fáceis de distinguir do que as grandes letras em relevo dos livros que utilizavam.

Poblemas com o sistema de Barbier

Com o sistema de Barbier não se podia soletrar: fora planejado somente para representar palavras como uma colecção de sons. Não se podia pôr vírgulas, pontos finais ou qualquer tipo de pontuação nas sentenças. O capitão Barbier não havia programado nenhuma combinação de pontos para tal. Também era impossível acentuar palavras – parte essencial da ortografia francesa – ou escrever números, operar matemática, compor música...

Havia muitos sinais para uma única palavra. Cada símbolo podia equivaler a seis pontos, e uma única sílaba de uma palavra podia necessitar de vinte pontos. Isso era demais para sentir com um dedo, e havia muitos mais em cada grupo para ter de lembrar.

Sem dúvida, era bem melhor que as letras em relevo de Valentin Haüy, mas gradativamente todos eles concordavam que eram, de fato, pontos demais, e os pontos não diziam o suficiente.

Os detalhes precisos do encontro entre Braille e Barbier não foram registados, mas sabe-se que Barbier ficou surpreso ao descobrir que um menino de 13 anos pretendia haver resolvido problemas que ele não conseguira.

Apesar de sua consideração pelas crianças cegas, para as quais desenvolvera a sonografia, o capitão Barbier não podia compartilhar a convicção de Louis da necessidade de um sistema tão elaborado. O que os cegos poderiam querer além da compreensão da comunicação básica? Por que desejariam um alfabeto completo, pontuação, até matemática e música, como aquele menino ambicioso estava sugerindo?

Ele não compreendia a ânsia por algo que permitiria aos cegos entrar totalmente no mundo da literatura e da ciência, aptos a ler e compor o pensamento mais complexo e comunica-lo aos outros no papel.

Experiências de Louis Braille

Diante da obstinação do capitão Barbier, insistindo que o sistema era tão bom quanto necessitava ser, Braille desistiu de convence-lo. Mas estava certo que os melhoramentos poderiam ser feitos. Com o sem Barbier, ele experimentaria e simplificaria. Descobriria algo que fosse adequado, manejável, que fizesse tudo o que a linguagem escrita e falada podia fazer, com toda a flexibilidade do alfabeto normal.

Então o menino Louis iniciou sua busca. Trabalhava em todos os momentos extras que pudesse extrair do dia atribulado de aulas, recomeçando à noite, logo que o dormitório silenciava, prosseguindo nas primeiras horas da manhã, nas férias do longo verão, calculando, experimentando, revisando, continuando sem interrupção.

O princípio do Braille

Em Outubro, quando começou o novo ano escolar, Louis Braille sentiu que seu alfabeto estava pronto. Ele encontrara um modo de formar todas as letras do alfabeto, os acentos, sinais de pontuação e os signos matemáticos usando apenas seis pontos e alguns pequenos traços horizontais.

Pela primeira vez, os alunos puderam tomar notas, copiar as passagens que gostavam, até o livro inteiro, com faziam as pessoas de visão normal.
Mas, Braille continuou experimentando e aperfeiçoando seu "pequeno sistema", como ele chamava.

Em 1826, ainda um estudante de apenas 17 anos, começou a ensinar álgebra, gramática e geografia para os alunos mais jovens: o estudante cego estava tornando-se, rapidamente, um excelente professor para os cegos.

Um professor inspirado

Em 1828, com a idade de 19 anos, Braille tornou-se oficialmente professor da instituição e, quando a escola reabriu após as férias de verão, assumiu o ensino de gramática, geografia, aritmética e música.
Saúde debilitada

Nos primeiros anos da década de 1830, Louis Braille esteve quase sempre enfermo. Por volta de 1835, foi se tornando impossível ignorar os crescentes sinais que era portador de alguma doença. Ele estava apenas no começo de seus 20 anos, mas sentia-se sempre cansado, com febre, e aperto no peito.

Uma noite, ele acordou ardendo em febre, sua boca subitamente enchendo-se de sangue. Não havia mais dúvida – o jovem estava tuberculoso.

Durante todos os próximos anos a saúde de Braille foi piorando. Os médicos resolveram manda-lo de volta para casa, beneficiando-se do ar puro do campo.
Mais tarde em 1843, ele retornou a Paris, mais revigorado

Os últimos anos de Braille

Por volta de 1850, Louis Braille sentiu que suas forças estavam chegando ao fim. Parou de dar aulas.

Louis Braille morreu no dia 6 de Janeiro de 1852, apenas dois dias depois de completar 43 anos, muito amado e lembrado não apenas por todos aqueles que o conheceram bem e sentiram os benefícios de sua natureza honesta, amável e inteligente mas também pelos que haviam sido influenciados e auxiliados por aquele humano e atencioso professor.

Mas só nas três décadas seguintes, ele se tornaria famoso no mundo todo como o notável benfeitor dos cegos, o homem cujo trabalho constituiu a rota pela qual milhões de cegos iniciariam uma nova vida, podendo ler, escrever, comunicar-se, aprender, criar e exercer seus plenos direitos na sociedade como seres humanos cultos e educados.

Autoria: Neida Marina -Rio de Janeiro – 2003
http://www.nossosaopaulo.com.br/

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