quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O FUTURO DA FAMÍLIA






A família já não existe, estamos a viver a maior crise familiar de sempre, ninguém sabe hoje o que é a família: exemplos de frases que ouvimos todos os dias e que nos deixam inquietos face ao futuro.

Não penso assim: a minha convicção é que o século XXI trará novos entendimentos sobre a questão familiar e que os jovens de hoje entenderão cada vez melhor o sentido de pertença a uma série de pessoas que, através de várias gerações, moldaram a sua maneira de ser.

Importa conhecer as transformações da família, ocorridas sobretudo na segunda metade do século passado. Leitores mais velhos ainda podem recordar alguns aspectos da família do Estado Novo, esse período sinistro da nossa história recente que alguns pretendem branquear: as mulheres ficavam em casa a cuidar dos filhos, os homens trabalhavam todo o dia e pouco participavam na vida das crianças, o casamento era com frequência produto de interesses vários e, se durava para toda a vida, em muitos casos estava longe de corresponder a um ideal de felicidade. As famílias eram numerosas (embora a elevada mortalidade infantil dizimasse muitas crianças) e as questões educativas mantinham-se a cargo das mulheres e de uma escola que englobava apenas uma parte dos mais novos. A família era um agregado mais estável, sem dúvida, mas alguém poderá sustentar que as pessoas viviam melhor ou eram mais felizes? A pobreza, o obscurantismo, a desigualdade de género, a infidelidade aceite e frequente por parte dos homens, a ausência de respeito para com os mais novos (a quem raramente se pedia opinião e a quem se espancava sem hesitação, na família e na escola) são apenas alguns aspectos da vida em família, que Salazar escondia com uma propaganda intensa sobre a «célula indissolúvel da sociedade».

Tudo mudou a partir dos anos 60. É verdade que com muitas hesitações e erros, mas com mais verdade e frontalidade. Dois aspectos merecem realce: consolidou-se o casamento por amor (e não por interesse) e surgiu robustecido o amor parental. No século XXI, casa-se porque se ama, por isso o divórcio cresce quando se deixa de amar. Há muitas separações, mas a maioria dessas pessoas volta a casar-se e procura novo entendimento baseado no afecto recíproco, quase nunca numa conveniência de interesses financeiros ou familiares. Os filhos planeiam-se e o amor parental nunca foi tão importante como agora: os pais, com todas as dificuldades e inseguranças que caracterizam a parentalidade de hoje, amam os filhos e tudo fazem para que eles sejam «felizes». Jamais existiu tão grande preocupação com os mais novos, nem em tempo algum a sociedade criticou tanto os «maus pais», ou denunciou com tanta veemência a minoria de progenitores que maltrata os descendentes.

Para além destes aspectos, importa assinalar que o espaço privado ganha cada vez mais importância. As grandes narrativas que pretendiam explicar o mundo – como as religiões ou as revoluções que se diziam universais – perderam adeptos. No Ocidente, poucos agora dizem querer morrer por Deus ou pela revolução e são questões da intimidade que ganham relevo: a luta pela liberdade de expressão, a voz contra a discriminação, o direito à diferença, o respeito pelos mais novos. É certo que o casamento é instável, que existem muitos divórcios e que surgem com frequência grandes conflitos entre pais e filhos, mas a família permanece como espaço emocional decisivo.

Quando se questionam os adolescentes sobre quem mais os influencia, na maioria dos casos a resposta é a mesma: são os pais. Numa etapa do desenvolvimento como a adolescência, caracterizada por algum confronto entre gerações, interessa verificar como esta influência se mantém e perdura, sendo essencial para o futuro.

Importa compreender que se vive mal sem pertença e que, num mundo ameaçador e imprevisível como o de hoje, a história da nossa família e a relação com os nossos próximos constitui a referência fundamental: é a partir dos nossos antepassados que adquirimos a força estruturante para viver, alimentada todos os dias pela empatia que soubermos despertar nos outros e que eles poderão sentir por nós.

Daniel Sampaio in Porque Sim

“Os pais com maturidade sabem que os filhos não lhes pertencem”



Comentário:

“Estou de acordo com Daniel Sampaio com a crónica que faz sobre o Futuro da família em quase tudo. Digo quase porque não o estou na totalidade do texto, é que efectivamente a família nos dias de hoje está em decadência. Faltam referências, não existem horas para nada e a liberdade que hoje se concede aos jovens, na maioria das vezes por conveniência dos pais, possibilitou que este conceito de família ficasse perdido por entre o ritmo que a vida é vivida presentemente.

Claro que estas novas exigências obrigam-nos a procurar e a encontrar, novas formas de relacionamento entre pais e filhos, mas devo reconhecer que hoje há mais VERDADE!”.

GOLDFINGER



5 comentários:

Mare Liberum disse...

Um excelente post sobre a família e que deve ser lido segunda vez.É na família que se encontram os pilares fundamentais da vida e quando ela não é equilibrada os filhos também não podem/ conseguem sê-lo. As excepcões são raras. A independência económica da mulher permitiu-lhe dizer não quando a relação com o parceiro começa a deteriorar-se o que no século passado e em muitos casos ainda hoje não era/é possível.

Bem-hajas!

Beijinhos

Fatima disse...

António ande sem tempo para a net,

Por aqui ainda há família, felizmente!

Abraços para vocês

gaivota disse...

a família é sempre o pilar da continuidade,
um bom texto, com muitas verdades, mas continuo a sentir e saber o que é de facto uma família, mesmo que desmembrada... daí podermos seleccionar os elementos que permanecerão no mesmo pilar!
beijinhos

São disse...

Há famílias e famílias...
Além disso, o modelo actual não é assim tão antigo.
Interessa, isso sim, é a união entre os membros e a responsabildade mútua.

Um grande abraço, Tonico, para vós.

Dalinha Catunda disse...

Querido Antonio,
Eu acho que hoje vivemos a verdade.
Não quero generalizar, mas o casamento durante muito tempo foimais um negócio que um caso de amor. A mulher que era submissa ao pai passava a ser submissa ao marido. Muitas vezes arrastava correntes e ficava prisioneira de um casamento. O homem podia tudo e a mulher no máximo dizer amém. Sempre me rebelei contra tudo isso. Sempre quis um homem para ama-lo e não para ser escrava dele e por conseguinte ATURÁ-Lo. Hoje vivemos com um homem por ser nossa opção, por querer. A familia é mais democrática, mais aberta e mais feliz. Eu gosto de ser mulher, de ser amada, de ser amante. Escravisada eu envenenaria meu dono.
Um abraço,
Dalinha