sábado, 5 de dezembro de 2009

CASOS INACREDITÁVEIS ENTOPEM OS TRIBUNAIS SUPERIORES





Mudanças de 2007 para limitar recursos junto do Supremo começam agora a dar frutos visíveis



Para quem recorre a um tribunal, não haverá processo com valor superior ao seu. Olhando de forma desapaixonada para litígios que passam por várias instâncias e chegam ao Supremo Tribunal de Justiça, dificilmente se pode concordar. As reformas feitas em 2007 nas leis penais e civis, limitando os recursos para o Supremo, começam agora a ser mais visíveis e já terão contribuído para os números do ano passado: os processos entrados, num total de 4190, desceram ao valor mais baixo desde 2000.·
"Há situações que não têm dignidade para chegar ao Supremo", concorda Eurico Reis, juiz-desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, que considera as novas regras "equilibradas e justas". Na área cível, passou a vigorar o princípio da dupla conformidade. É simples: uma decisão da Relação que confirme a primeira instância, com os mesmos fundamentos, não é passível de recurso para o Supremo. Também na área criminal foram introduzidas limitações, quando as sentenças confirmadas se traduzem em penas de prisão até oito anos.

Eurico Reis sublinha que as questões de direito de personalidade podem sempre subir ao Supremo, mas defende que para casos comuns, como dívidas ou contratos, "é suficiente ter duas instâncias". Um tribunal superior menos atulhado de papelada terá mais capacidade para se concentrar no essencial.







Um recurso é o exercício de um direito, lembra António Martins, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, que não considera o sistema português excessivamente garantístico. Alerta, isso sim, que o problema está nas regras processuais. "O nosso processo enferma da possibilidade de ser mal usado excessivamente", afirma, defendendo que o processo seja "mais simples e desburocratizado".

Sem pôr em causa a importância e validade dos casos para quem os enfrenta, o i seleccionou exemplos de processos caricatos ou que à partida suporíamos de resolução simples, mas acabam enredados em sucessivos recursos.

Esgotos Os tribunais estão habituados a disputas para usar caminhos rurais, mas mais invulgar será guerrear pelo subsolo. Em 2005, dois irmãos invocaram o direito de manterem uma ligação de tubos de esgoto sob a casa do vizinho. O caso foi para a Relação de Coimbra, que indeferiu, considerando que “só por inércia ou comodismo” pretendem manter a tubagem, quando passou a existir uma rede pública de esgotos.







Faca de cozinha A 20 de Março do ano passado, J. assistia à procissão do Senhor dos Passos com uma faca de cozinha na sua posse. Foi quanto bastou para o Ministério Público o acusar do crime de detenção de arma proibida. O Tribunal de Braga rejeitou a acusação “manifestamente infundada”, o que não impediu o procurador de recorrer para a Relação de Guimarães, que em Fevereiro confirmou a decisão: ter uma faca de cozinha não constitui, por si só, qualquer crime.

Palmeiras Em 2002, M. chegou a um terreno que tinha comprado na Parede (Cascais) e descobriu que sete palmeiras ali existentes tinham sido arrancadas. Acusou o vendedor do terreno e exigiu 50 mil euros de indemnização. Sete anos depois, o caso passou por três tribunais e todos concordaram que o réu tem de pagar o valor das palmeiras. Mesmo que houvesse, como foi invocado, um acordo verbal, a doação de “coisas móveis futuras” tem de ser feita por escrito.







Injúria Uma discussão entre vizinhos pode acabar não num, mas em dois tribunais. J. foi condenada, pelo Tribunal de Cantanhede, a 70 dias de multa e a pagar uma indemnização de 700 euros a um vizinho, a quem terá chamado “tolo” e “deficiente”. A fechar a discussão, disse uma frase mais violenta: “A deficiência que tens foi castigo de Deus e a tua mãe é uma puta.” Inconformada com a condenação, recorreu para a Relação de Coimbra. A pena foi confirmada.

Todos os nomes Um “não” de uma conservatória acaba muitas vezes em tribunal. J.A.O.D quis incluir a alcunha no nome e mesmo depois da segunda recusa levou o caso para a Relação de Lisboa – onde ouviu o terceiro “não”. Idêntico foi o circuito de um casal algarvio que insiste te em chamar Diego ao filho, nascido em 2007. O nome não consta na onomástica nacional, respondem os tribunais, que remetem para o correspondente Diogo.








Telemóvel Casos como este irão desaparecer dos tribunais, já que as operadoras passaram a cortar os serviços a quem não paga a conta. Mas nos tribunais ainda se arrastam casos antigos de dívidas em atraso. A Relação de Lisboa considerou, em Julho, prescrita uma dívida de 2706,79 euros de uma cliente à Vodafone. Só admitiu, como na primeira instância, o dever de pagar 504 euros por violar um contrato de fidelização.

Família Tribunal de Família, Relação de Lisboa e, no mês passado, Supremo. Foram precisas três decisões iguais para forçar N. a pagar prestações de alimentos ao filho, em dívida desde Setembro de 2004. O pai invocou a condição de desempregado para suspender o pagamento. O Supremo deixa-lhe um recado: “Procurar activa e diligentemente uma actividade profissional ou laboral.”

por Inês Cardoso, Publicado em 02 de Dezembro de 2009

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GOLDFINGER


1 comentário:

gaivota disse...

antónio, nem me atrevo a falar de tribunais e das (in)justiças além dos temposssssssssss arrastadíssimos que tudo leva!
é um escândalo entre tantos que estão de pedra e cal no nosso país!
beijinhos