domingo, 19 de julho de 2009

RADIOGRAFIA DE UM GOLPE DE CHARME – PARTE I




Há 40 anos grupo de Palma Inácio realizou o primeiro desvio de avião comercial




Há 40 anos, um grupo de seis operacionais anti-fascistas portugueses realizou o primeiro desvio de um avião comercial da História. Numa operação concebida por Henrique Galvão e chefiada por Palma Inácio, o voo TAP de 11 de Novembro de 1961 do Super Constellation Mouzinho de Albuquerque de Casablanca para Lisboa foi desviado, com o objectivo de lançar panfletos anti-salazaristas em várias cidades portuguesas. Era o tempo em que os "terroristas" faziam ponto de honra em não colocar vidas inocentes em risco, e limpavam as lágrimas às donzelas. Mas há algo próprio à natureza de todas as operações políticas ilegais: em certo momento, é preciso não pensar, fechar os olhos e avançar.

Naquela noite, para que os contratempos ficassem definitivamente para trás, foi preciso acelerar e mergulhar sem medo no escuro. Dez de Novembro de 1961. 0 primeiro carro saiu de Tânger ao princípio da noite, em direcção a Tetuan. Camilo Mortágua, 27 anos, ia ao volante, a cabeça enterrada nos ombros, pensativo. Palma Inácio, o veterano do grupo, quase nos quarenta anos, ia ao lado, sempre a mexer-se, com um ar diligente e divertido em simultâneo. O ostensivo à-vontade dos dois surtia um contraste indisfarçável com o nervosismo do sector do banco de trás. Amândio Silva, 22 anos, alto e atlético, tentava manter a sua pose de ousadia melíflua enquanto se concentrava nas tarefas de logística de que estava incumbido. Helena Vidal, 20 anos, grávida, a tremelicar de fervor revolucionário, procurava uma posição em que náo a magoassem as cinco pistolas que levava presas à barriga com uma cinta. Joáo Martins, 27 anos, enorme e de bigode façanhudo, evidenciava alguma confusão, pois tinha entrado no carro sem saber nem para onde iam nem o que iam fazer.

À saída de Tânger, aconteceu o que previram: um carro cheio de agentes da Pide saiu atrás deles. Há meses que, na cidade, os pides seguiam todos os seus movimentos. Iam aos mesmos cafés, frequentavam os mesmos hotéis. Sabiam quem eles eram e qual o propósito da sua estada em Marrocos: preparar uma acção contra o regime de Salazar. Por isso, todos os dias, durante dois meses, Palma, Camilo, Amândio, Helena e Fernando, bem como o líder Henrique Galvâo e outros operacionais, iam ao porto de Tânger, fingiam que conversavam com uns e com outros, visitavam barcos. Tudo para convencer a polícia política de que preparavam uma operação marítima, como a que Galvâo tinha lançado meses atrás, com o paquete Santa Maria. Enquanto isso, outros elementos do grupo iam clandestinamente ao aeroporto de Tânger, informar-se sobre o voo de Lisboa que fazia escala em Tânger, seguia para Casablanca para, no dia seguinte, regressar directamente a Lisboa. Tratava-se geralmente de um avião francês fretado pela TAP, com piloto e técnicos franceses e tripulação de cabine portuguesa.


Paulo Moura/Pública

Foto da Net

GOLDFINGER

2 comentários:

Branca disse...

Olá António,

Palma Inácio, um herói da minha juventude, porque para além do mais foi ainda a LUAR que no pós 25de Abril esteve na dianteira da ocupação de casas abandonadas onde ainda hoje funcinam algumas Associações de bairro e infantários. Dirão que atràs dessa causa houveram alguns excessos, pois houveram mas mais cometidos por uma outra esquerda, menos imparcial e romântica que a da Palma Inácio, que talvez por isso se foi remetendo a um respeitoso silêncio.
Deixo-te beijinhos.

Mare Liberum disse...

Eu estive na abertura das portas de Caxias. Ainda hoje me arrepio só de falar nisto. Eram lágrimas, eram risos, era a saudade, era a revolta, era a vitória.
Hoje, poucos são aqueles que valorizam esta gente que se viu privada da liberdade por tanto lutar por ela.

Bem-hajas!

Beijinhos mil