sexta-feira, 24 de julho de 2009

RADIOGRAFIA DE UM GOLPE DE CHARME – PARTE VI





Em Outubro de 1961, Fernando Vasconcelos, com 19 anos, deveria entrar na Universidade do Porto. Isso não chegou a acontecer porque estava a começar a guerra colonial, porque parecia não haver forma de combater a ditadura, e porque, ele e Maria Helena, com quem casara há um mês, decidiram fugir do país.

Compraram um pequeno barco de seis metros com um motor fora-de-borda de 25 cavalos chamado Rumo e, com outros quatro companheiros, numa manhã de São João, enquanto o Porto dormia, fizeram-se ao mar.

Pararam em Cascais, onde entrou outro resistente, que era procurado pela Polida, depois em Aljezur, e partiram, os sete, para Tânger. Como estava previsto que a viagem duraria quatro dias, levavam combustível ajusta para a travessia, 70 litros de água e latas de conserva. Como instrumentos de navegação levavam uma bússola, um receptor de rádio, porque sabiam que, ao sintonizar uma estação de ondas médias, o sinal era mais nítido quando se dirigiam na sua direcção, e uma edição liceal de um Atias.

Mas ao segundo dia de viagem foram apanhados por uma tempestade. Desviaram-se da rota, andaram as voltas e quando o vento amainou estavam no alto mar sem combustível. Navegaram à deriva durante sete dias, racionando os mantimentos: dois copos de água e uma almôndega por dia. Já quase tinham perdido a esperança, quando surgiu um petroleiro, que os salvou. O navio, de bandeira liberiana, armador americano e tripulação italiana, meteu-os a bordo e rebocou o barco até Gibraltar. Pediram asilo político, mas a Grâ-Bretanha recusou, concedendolhes um prazo de 24 horas para consertarem o barco e partirem. No dia seguinte, conseguiram chegar a Tânger, onde lhes foi concedida uma autorização de permanência.

Parte do grupo decidiu aceitar convites para estudar em países socialistas, mas o que Fernando e Maria Helena queriam era combater o regime de Salazar. Contactaram com revolucionários argelinos da FNL e, meses depois, com Henrique Galvão, que chegara a Tânger com os seus operacionais.

Quando Fernando Vasconcelos e Maria Helena Vidal se integraram no grupo de Palma, Amândio e companhia, já Manuel Serra, Raul Miguel Marques e José Paulo da Silva Graça tinham partido para Portugal, para atear a revolução. Saíram às 4h00 da manhã de Tânger, apanharam o barco de Ceuta para Algeciras, chegaram a Sevilha, de táxi colectivo, ao cair da noite. Dormiram numa pensão e pelas 8h00 da manha apanharam um comboio para Cáceres. Foi aí que tiveram pela primeira vez a suspeita de que estavam a ser seguidos. A polícia pediu-lhes os passaportes umas dez vezes durante a viagem. Apearam-se em Cáceres, esfomeados, entraram num restaurante, e estavam a comer a sopa quando entraram seis agentes da Polícia política espanhola. "Passaportes! Os senhores estão presos!".

Quando, na esquadra, foram interrogados, um de cada vez, José Paulo contou a história que tinham combinado: vinha, com aqueles amigos, visitar o comandante da Polícia Joaquin Cabrera, grande amigo do seu sogro, Rolâo Preto... A história tinha um fundo de verdade.


Paulo Moura

Foto da Net

GOLDFINGER



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